quarta-feira, 22 de julho de 2015

FAZEDOR


Trago luzes 
Leio letras 
Vejo coisas
Tento teias
na volta da curva uma palavra reta 
que entorta feito luva
que cai mas não bate na porta
dos navios que aportam enquanto esperam na fila de quem precisa
meus lábios tremem e a traquéia aperta sem deixar passar o ar esperando o coração parar mas ele bate de frente e forte pelos laços que importam que não desatam com atos nem fatos nem artefatos
laços apertados feito cadarço
feito nó duplo
no tênis sujo que a gente gosta de usar
que não deixa lavar
que faz com que tudo seja tudo agora
As luvas
Os fatos
Os duplos
Os laços


Douglas Campigotto

OLHOS CERRADOS


acordei com sensação de ninguém
não sabia ao certo 
porque levantar da cama
se saía 
se comia
se tirava o pijama
medo de abrir os olhos
de não enxergar
adoro telefonar
de olhos fechados
falo até esquentar as orelhas
amo limpar gavetas
procuro sabendo que não vou encontrar
ando de um lado pro outro
como quem acha
na minha cabeça nada passa
só um pensamento solitário
um filme que teima em reprisar
e agora na hora de dormir
não sei se quero deitar
medo de não acordar
de não levantar
continuo cultivando antigos hábitos
mantendo meus olhos bem fechados


Douglas Campigotto

TUDO MESMO


O desejo é o tudo
Resultado é o mundo


Douglas Campigotto

(IN)DIFERENTES


A diferença não me assusta.
A indiferença me apavora.


Douglas Campigotto

A VIDA COMO ELA É


Hoje fui um frentista, sendo mecânico, eu mesmo, sendo artista, jogador, ator, atordoado com a crise que paira, que não pára, inflação que inflaciona o preço daquilo que já não podia pagar, gasolina tá cara pra quem tem carro, preço alto que se paga pra quem decide andar, pedalar, de mãos atadas, braços arrancados, seguimos sem saber o dia de amanhã e isso é enlouquecedor, quem será o próximo preso, o próximo avião que cairá, se o samu vai chegar e quem vai levar, penso nos diferentes pesos e logo peso, hoje eu fui um artista, sendo frentista...

Douglas Campigotto

PERDAS E DANOS


Perdem por tão pouco e acham normal, ser pouco, perder.

Douglas Campigotto

AS COISAS QUE FALAM


ouço as louças e talheres nas casas vizinhas
elas falam de comida e outras coisas
misturadas aos televisores que nem sempre funcionam
por falta de luz
todos deixam as janelas abertas
mas observam de suas redes
pássaros engaiolados
no telhado que bate na janela
aos retalhos do vento farto
do inverno que não espanta os gatos
que passeiam em seu reinado
entre fezes e corajosos ratos
caem papagaios
decepados no ar
caçados feito mosquito
que vôa feito mosca
que trás cor aonde cai
a caixa d'agua que aborta
por dobras tortas
voam mesas janelas e portas
plutão se aproxima
a lua enciumada nos olha de cima
pronta pra minguar
parece perceber o filho da vizinha
que chora sem hora para parar
será pelo planeta
por sua história
ou
pelo som ensurdecedor da água que jorra


Douglas Campigotto

POEMA PERDIDO


perdi um poema
se tornou impossível encontrá-lo
resgata-lo
não que ele precisasse de salvação
eu sim
esqueci de salvar
procurei incesantemente
mas não achei
não sabia do estava falando
como achar aquilo que não se sabe
difícil saber
eram palavras nem tão bonitas
que juntas diziam algo
que eu passei
pensei
coisas que vi e que nem sempre agradam
agora me vejo procurando esse poema
sem nome
sem pontuação
lembro de uma parte que dizia
"vejo grama nas paredes
cabeças sem corpo
sapatos brancos de talco"
que me faz lembrar
de festa
dança
bebê
assadura
farinha
cocaína
bucha
pino
frango
e por aí vai
palavras que nos levam a outras
outros
lugares
poemas
amigos
amores
fatos
mais um poema que poderia ser
mas são só palavras
ditas a esmo
bonitas palavras nem tanto
se atropelando
se fazendo entender
se entregando de bandeja
no peixe
na grelha
na farra
no olho
na alma
na faca
no ato
na palavra


Douglas Campigotto